Sangue de Rato
Entra a estulta campanha em ambicioso pré-ponto de neste fervente Fevereiro chegar ao cume da brejeirice provinciana, tão cara nalguma má formação que ninguém poupa, alastrando por essa sociedade, qual epidemia que galga desde o baixo extracto social até ao cimo, onde, não raras vezes, se empoleiram os piores, mas com o augusto título herdado da prosápia ou do poder de serem figuras públicas com elevados (e louvados!) instintos de trepadeiras daninhas, logo, uma má formação “menor”, mascarada, “desculpável”. E é neste lodoso terreno que alegremente entram os nossos políticos de serviço. Havendo um claro vazio de ideias, seguem pelo desnorteante rumo de se atacarem, de ratarem a vida privada de cada um, de se mostrarem mui viris perante um comício de fêmeas, de insinuarem as suas preferências de cama em oposição às supostas preferências dos outros; porque o que é preciso saber é se é um adepto do sexo “direito” ou se é o outro dado ao enlace “invertido”. Se tem crias para legitimar posições políticas ou se são servis criados para certos serviços. Tudo importantes questões a serem discutidas na praça, onde o público aplaude, hipnotizados e rendidos aos espectáculos da vida real, em escarros impressa nas páginas cor-de-rosa. Lá queremos nós saber das posições de cada um! Do que pensam para o país, de quanta pátria lhes corre nas veias! Nós precisamos é de saber com quem eles dormem. Se são pais de família. Se são de boas famílias, já agora! Como se esfregam nos lençóis. E com quem! Com quem, sobretudo. E a que horas. Em sestas, entre inaugurações apressadas e jantaradas ao feminino? Isso sim, mata-nos a curiosidade. Aguça o interesse da populaça. Nas franjas e no acessório se conquistam audiências, e audiências são votos, e votos são poder, e poder é governar, e governar é foder. E para lá chegar, urge foder o próximo. Deitá-lo por terra e dizer que não se disse aquilo que a torpe comunicação social, de conluio com todos e com nenhum, fez o favor de anunciar, para fragilizar, porque mais forte do que a campanha política é essa outra campanha, uma qualquer, orquestrada por alguém que à boca pequena se insinua, não insinuando, porque tudo é névoa, e a névoa é alva, e sou eu o puro, e sou eu a vítima, e são eles uns filhos da mãe, mas não será preciso esperar muito tempo para todos saberem quem é, afinal, aquele que vai à frente nesta grave corrida para o doce poder. Uma cabala. A cavalo de uma cabala. Que raio! São todos perseguidos. São todos vítimas. E são! São vítimas da sua incompetência, da falta de ideias. E se ideias não existem, voltemos ao início, então que se ataque as pessoas na figura do outro que é adversário, e que o adversário ataque o adversário, porque tanto está um perdido quanto o outro. Ambos vazios. Todos vazios. Tudo vazio: Ah!, que nojeira!
2 Comments:
olha que já não é bem assim apesar da ironia e da qualidade da prosa.
este povo, de tanto alancar parece estar levantar o costado e no dia 20 são capazes de lhes pregarem uma surpresa. eu participo. voto branco.
Caríssimo (caríssima?) anónimo,
Longe de mim querer enfiar dez milhões em saco tão pequeno. Nunca foi minha intenção dizer, se é que assim leu, que somos todos uma cambada de pacóvios mal formados que só nos interessamos pela vida privada de cada um, alegremente vivendo de olhos fechados para a podridão. Há-os, com certeza, em generosa (e perigosa!) quantidade, mas, ainda assim, não creio (ou não quero crer) que sejam (sejamos) a “maioria”. O texto, irónico, quiçá inflamado, dispara em todas as direcções, porque todos, na sua (nossa) quota-parte - enfie a carapuça quem tiver de a enfiar - contribuem para a “falta de nível” a que, aparentemente, estamos a chegar. Que pensar quando se noticiam boatos? Quando eles se tornam pragas? Quando são eles que “animam” campanhas? Quando tudo se torna numa campanha (de “vitimização”)? Quando, numa campanha, a tudo se alude, entrando em minudências comezinhas? Quando a discussão sobre a saúde, a educação, a justiça, o desemprego (só para citar alguns) é abafada pelo ruído das polémicas? Quando essas polémicas são o prato preferido das televisões, dando-lhes destaque, “inflamando”, porque das polémicas não deixam de dar notícia? Que pensar quando os jornalistas se acercam dos políticos com essas questiúnculas, querendo mais, tentando tirar mais “nabos da púcara”: “que tem a dizer da insinuação que ele fez?, Que tem a dizer da polémica entre os outros dois?”, para, provavelmente, terem mais audiências, sabendo que essas audiências se “apaixonam” pelos escândalos? Então não são as revistas cor-de-rosa um êxito? Para todas há mercado! E são tantas! E não entram os políticos em “política cor-de-rosa” ao falarem da vida privada dos seus oponentes, usando essa “estratégia” para os “enfraquecer”, em vez de usarem da argumentação baseada em ideias? Por isso, às vezes, parece que tudo se confunde, se funde. E funde-se. Porque já falta discernimento. Não há fronteiras, meu amigo, literal e metaforicamente falando. É um desbocado salve-se quem puder.
Mas muito me agrada o seu optimismo: é bom sinal. Dele precisamos. Para lutar. Abramos os olhos, uns aos outros. E espero bem que naquele texto, assim como nesta resposta, tenha caído num "mau" momento de exagero, ainda assim, "pela rama", como diria o nosso Camilo.
Sinceros cumprimentos
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