Prosa Insana # 13
Toca, já me cheira ao Verão. Não tarda, e o sério calor bate-nos à porta. É dizer-lhe: faça a fineza de entrar. Entre que eu já estou prontinho para esta estação das quenturas, de corpinho seco para o torrar à beira-mar, isto se arranjar uma nesga de espaço livre no litoral apinhado de banhistas vindos dos quatro cantos do mundo, com ganas de desfrutar do Sol ao preço da chuva neste maltratado jardim turístico, entregue à espertinha ervinha daninha, que por todo lado irrompe. Entre senhor Verão, que eu já estou magrinho, com graça, graças à crise que grassa, à qual se juntou a minha forte vontade de consumar a dieta light, numa febril irritação consumista, em meu ser, nunca vista. Sim, porque embora escasseie o vil metal, não vive o corpo sem alimento. Light. Tudo light: manteiga, iogurte, bolacha, chocolate, donut, literatura. Sobretudo a literatura. Light e mini, ou micro. Sim, porque lá por o produto ser dietético, não se deve abusar. Numa dieta rigorosa não basta contar calorias, é preciso pesar. Pesar tudo o que chega à boca do estômago - sempre pouca quantidade. E no que à literatura diz respeito, digo: Nunca mais de quinhentas palavras por dia, com folga ao fim-de-semana. Até porque é o exercício essencial, logo, não se deve estar mais que quinze minutos alapado, com os olhos atrás dum grande livro, capaz de nos provocar uma indigestão letal. E, imagina, toca: eu, mortinho pelos banhos, e já sem corpo que banhar. A alma, a ficar, tanto quanto a minha estupidez saiba, não ocupa lugar, nem terá ânsias de banhos tomar. Portanto, toca, é continuar com a dieta, e esperar pelo ardente calor da estação, que promete queimar.
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